Ontem acudi a uma amiga a carecer de ombro. Bebemos um chá enquanto lhe escutei as mágoas. Queria que a ouvisse e que falasse. Ouvi. E falei.
O ex-namorado passou 12 anos a fazê-la sentir que não era suficiente, que devia ser mais do que era, que era menos do que ele. Não era uma coisa óbvia nem constante, mas foi a mensagem que ele passou em pequenos gestos que foi tendo ao longo do tempo. A coisa prendia-se apenas no facto de ele trabalhar num nível altamente corporate e ela ser "apenas" uma mestranda e depois doutoranda (ou seja, trabalha numa universidade, faz investigação mas não está encafuada num escritório das 9h às 17h).
Ela, miúda inteligente e com tudo para dar certo, foi-se deixando minar pela tal mensagem de insuficiência, sem se aperceber.
Há um ano e meio ele resolveu que era o fim. Aproveitou uma ida dela ao estrangeiro, no âmbito da investigação científica dela, para a presentear, no regresso com um "quero-me separar". Nunca disse claramente o porquê daquela separação e seguiu a vida dele. E ela ficou presa no tal sentimento de insuficiência que ele semeou nela.
Ontem, num momento de reality-check, disse-me que continua muito magoada, continua a sentir que não foi suficiente para ele, que não é suficientemente boa, nem suficientemente capaz. E, se a conhecessem, perceberiam o quanto isto anda longe da realidade. E diz ela que se sente extremamente insegura.
Olhando de fora: a tal sementinha que o ex-namorado semeou ganhou raízes. Ela precisa de validação dos outros para garantir ser verdade aquilo que ela vê todos os dias. Ele assumiu, durante toda a relação, o papel de macho-alfa (coisa para merecer o Oscar, só vos digo). E ela, mulher forte, capaz, passou a necessitar de validação externa para viver.
E porque é que vos conto esta história? Para relembrar o que todps sabemos: a pessoa mais importante da nossa vida somos nós mesmos. É a nós que temos que agradar porque, no limite, nós somos as únicas pessoas que, de certeza absoluta, vão viver connosco até ao fim dos nossos dias. Portanto, por muito medo, muita insegurança, muitas pernas a fraquejar que tenhamos, há que não perder o norte e relembrar que sim, temos valor, que sim, somos capazes e que sim, valemos muito a pena. Sem precisarmos que ninguém no-lo diga.