02.05.10
Há poucos dias apercebi-me. Só aprendi a dar valor à minha mãe depois de ser eu própria mãe. Só aí soube as dores, as angústias, as escolhas, as decisões. Só aí compreendi que a liberdade que me deram não foi de graça e que as responsabilidades que me exigiram não foram em vão. Havia um plano por detrás daquilo tudo. Não foi fácil. Não é fácil educar uma miúda com a mania que é rebelde, mesmo que isso não passe de mania porque, verdade seja dita, nunca dei chatices aos meus pais. Acontece que eles continuam a educar-me. E ensinam-me todos os dias a educar. E eu bebo cada gotinha daquilo porque sei que, infelizmente, não durarão para sempre e que haverá alturas em que eu olharei para cima e dizer "que jeito que me dava aqui agora a minha mãe, ela havia de saber resolver isto".
A minha mãe teve (tem) falhas. Mas tem um mérito do caraças. Veio do Alentejo já casada, com a 4ª classe. Ficou (ficaram) a viver em casa dos meus avós paternos até poderem levantar voo e aterrar em ninho próprio. Pelo meio nasci eu. E a minha mãe resolveu começar a estudar. E a trabalhar. Foi costureira, trabalhou em fábricas, acabou a trabalhar numa pequena indústria que a atirou para o desemprego há coisa de ano e meio (coisa que eu, apesar de tudo, agradeço, porque foi o que permitiu que ela fique todos os dias com a minha filha). Pelo meio estudou, sempre à noite. Acabou o 12º ano no ano em que eu acabei o 7º. E trabalhava. Levantava-se às 6h, ia para a fábrica, voltava directamente para a escola, ia para casa, passava a ferro, fazia o jantar para mim e para o meu pai, para o dia a seguir e, lá pelas 2 ou 3 da manhã, ia dormir. Para acordar às 6h e fazer tudo outra vez.
E, apesar deste ritmo maluco, nunca desistiu. Queria conseguir um emprego normal, qualquer coisa no Estado, por exemplo. Nunca conseguiu. Mas não se arrepende de nada. E a mim nunca me faltou mãe. Ela esteve sempre lá. Mesmo quando me exportava por períodos de 5 meses para o Alentejo, para poder estudar, esteve sempre lá. Hoje continua a estar sempre lá. Claro que nos demos mal toda a vida. Porque eu era parva o suficiente para achar que devia poder fazer tudo sem fazer nada em troca. Quando isso acabou - quando fui viver sozinha. E passámos a gostar muito mais de estar juntas. Passei a dar muito mais valor àquela mulher que se virou do avesso para me poder dar tudo o que não teve, tudo o que achava que eu merecia.
Mas só percebi o quanto a amo na noite em que nasceu a minha filha. Foi a minha mãe que esteve lá, ao meu lado, a abanar-me uma arrastadeira descartável à frente da cara, tal o calor que eu sentia. Foi a minha mãe que chorou assim que viu a menina. Foi a minha mãe que me ensinou a ser mãe. Não quero repetir os erros dela, mas tomara eu não fazer outros que comigo ela não fez. A minha mãe fez-me a mim e constrói diariamente a minha filha. E constrói-me a mim, enquanto mãe.
É a mulher que eu mais amo na vida. E só quero ter muito, muito tempo com ela. Para aprender. Para amar. Para dar. E para lhe dizer o quanto gosto dela, o quão importante ela é para mim e o quão agradecida lhe estou por tudo o que faz por mim. Por nós.
Feliz dia, Mãe!
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